Enriquecendo e variando o “Abaixe os Ombros!”.

Pina Bausch

Recebi o comentário abaixo da Patrícia, uma professora de Pilates que vive em Portugal e é seguidora nossa aqui do blog. Acredito que vale a pena refletirmos sobre o assunto.

“Falando em articulação escapulo umeral, hoje um aluno me perguntou por que é importante manter a escapula em depressão em tantos movimentos de braço, ou por exemplo no Teaser no trapézio. Realmente sinto que sempre estou pedindo a depressão escapular para organizar os ombros. Eu tenho explicado de duas maneiras, uma é esta da organização e estimulação da musculatura das costas e outra em relação ao movimento do braço para não haver o pinçamento e estreitamento nas estruturas próximas da glenóide. O que você acha? Qual sua explicação mais simples e palpável para um aluno entender esta correção de uma forma melhor? Ou algo que eu possa fazer na prática para que ele entenda?“

Quando observamos uma criança pequena se movimentando podemos nos dar conta de todas as suas articulações, todos os seus tobogãs internos. Sempre sentados sobre os ísquios, agachando sempre pela flexão do quadril, mantendo sua coluna perfeitamente neutra, elevando seus bracinhos com pescoços espaçosos e macios.

Seu movimento é “limpo”, ainda livre de tensões, aderências, desequilíbrios, todos esses elementos que vão, pouco a pouco, fazendo parte de nossa construção corporal.

Quando passamos a ser bípedes a cintura escapular deixou de ser uma zona de carga (assim como é a cintura pélvica), passando a ser uma zona de suspensão, sustentada por músculos, tendões e ligamentos. Essa característica liberou nossas mãos, braços, ombros proporcionando a eles um incrível ganho de mobilidade. Mobilidade esta que é gerida pela ação muscular.

Nosso grande problema como humanidade é que, muitas vezes essa ação da musculatura sobre ossos e articulações é mal coordenada.
Coordenar eficientemente um movimento é utilizar o mínimo de ações musculares para que ele ocorra. Quando estamos em pé parados, é difícil identificar quais músculos estão em ação para nos manter ali. Se a tarefa é mais desafiadora – carregar sacolas, subir escadas, entrar e sair do carro, será necessária uma ativação muscular maior e, provavelmente, a entrada em cena de músculos maiores. É proporcional: músculos grandes para grandes tarefas, músculos menores para desafios menores. Também é importante lembrar que uma tarefa que é pequena para um, pode ser grande para outro.

Quando estamos com a consciência corporal mais apurada, com nosso corpo mais pensante e nosso pensamento mais sensível às informações trazidas pelo corpo, podemos dizer que nossa coordenação está mais eficiente e sabemos dosar muito mais precisamente a utilização da força.

No caminho para essa eficiência, entretanto, precisamos nos concentrar na ativação das musculaturas estabilizadoras para que possamos encontrar nossos deslizamentos.
Aí entramos nós professores com duas estratégias principais no resgate da qualidade do movimento:

  • Estimular no aluno o despertar das sensações nas zonas de deslize para que haja a tomada de consciência dos ossos e articulações
  • Propor uma série de movimentos que ensinem os músculos a atuarem mantendo os espaços das juntas, garantindo seus deslizes. Blandine Calais disse num curso que os músculos grandes mal geridos parasitam as articulaçõe

Sugestões para despertar os tobogãs (deslizamentos articulares)

  1. Braço esquerdo solto palpe sua clavícula esquerda com a mão direita no sentido esterno acrômio. Sinta o osso, descubra sua forma. Agora dê pequenas batidas nas clavículas com as pontas dos dedos, também no sentido esterno – acrômio. Sinta a reverberação dessas batidas pelo braço e imagine que a tensão vai saindo pelas mãos do braço solto como se fosse areia caindo. Pare e observe os dois braços alongados antes de fazer do outro lado.
  2. Com os braços ao longo do corpo, palmas das mãos para frente, imagine que eles estão dentro de um tubo longo de plástico, apenas com as mãos para fora. Relaxe os ombros e coloque sua cabeça lá em cima, no topo de sua coluna, como se fosse um balão de gás. Gire os braços como um todo escondendo a palma da mão e a parte interna dos cotovelos. Atenção para manter um amplo espaço entre as clavículas e entre as escápulas. O movimento é apenas, do úmero na glenóide.
  3. Agora eleve seus braços pesadamente como se eles nascessem na sua nuca. Devagar, perceba como o peso do braço arrasta, naturalmente, os ombros para baixo. Essa prática é fundamental para compreender e treinar que toda vez que elevamos os braços o úmero deve , primeiro, abaixar sua cabeça, decoaptar, escapar do acrômio para garantir um deslize eficiente.
  4. Gosto bastante da imagem da cancela de carros que sobem para o carro passar. Seu braço é a cancela e a região dos ombros o peso que faz com que a cancela suba. A idéia a ser despertada é essa: quando o braço sobe os ombros, naturalmente, descem.
  5. Vejam também a postagem http://pilatespaco.blogspot.com/2009/11/manipulando-propria-escapula.html

Sugestões para aprimorar a coordenação muscular

Quadruped e Long Strech – cadeias fechadas

Nos exercícios de descarga de peso em cadeia fechada como os da série Quadruped (seja na Reformer ou no solo) ou Long Strech a tendência imediata da cintura escapular é ser empurrada pelos ossos do braço para trás (aduzindo as escápulas) e para cima (elevando os ombros).

Nesses exercícios de maior esforço é importante sim que solicitemos a estabilização escapular de maneira bastante efetiva. Devemos ficar atentos á escolha de nossas dicas verbais para que não acabemos caindo em vícios.

Gosto de destacar a manutenção dos espaços: mantenha o espaço entre ombros e orelhas, mantenha o pescoço longo, faça oposição , etc. Em relação a depressão das escápulas podemos utilizar outras ações como, deslize as escápulas para baixo, deixe suas escápulas acopladas nas costas como se fossem mãos (aproveite para colocar as mãos sobre as escápulas para enfatizar a propriocepção local).

Armwork facing side (adaptação para o trapézio) – caeia pseudo

Num exercício como este em cadeia pseudo com assistência da barra torre a solicitação da depressão escapular é bem menos importante do que o estímulo à sensação da báscula, do giro da escápula em seu próprio eixo.

Sentado sobre os ísquios com pés apoiados, coluna longa, cabeça equilibrada no topo da coluna. Segure a barra torre com a mão deixando o braço no ângulo da escápula. Ative apenas a garra dos dedos deixando o braço solto e pesado. Perceba essa sensação de peso arrastando braço e ombros para baixo.

Inspire suavemente pelo nariz e, enquanto expira tracione a barra para baixo sentindo a força para essa ação vindo das costas, tracionando toda a estrutura braço/ombros para baixo enquanto o pescoço ganha um grande espaço. Pare embaixo, inspire novamente e, enquanto expira, relaxe o máximo possível sua articulação deixando que a barra torre leve seu braço para cima, deslizando gostosamente
Peça ao aluno que coloque sua outra mão sobre o ombro para perceber o deslize na gleno-umeral.

Veja também a http://pilatespaco.blogspot.com/2009/06/um-elemento-importante-que-devemos.html

Pessoal! É claro que não é para fazer todas as repetições assim!!! Estamos no momento de estudo do movimento. Obviamente a intenção é colocar um ritmo respiratório mais fluido acompanhando um gesto mais contínuo. Podemos também ir introduzindo outras dicas como: enquanto expira afunile as costelas como um guarda chuva enquanto eleva o ânus e por aí vai.

Retomando a questão da Patrícia e seus alunos: devemos estimular todo o tempo a depressão escapular?
Eu acredito que não. Devemos procurar variar nossa formas de abordar o assunto e, a partir do momento que o aluno desenvolve a consciência das articulações, um movimento como erguer o braço acontece de forma naturalmente eficaz e fluida.

Espero poder ter ter contribuído para suas reflexões! Vamos compartilhando.
Beijo Silva.

10 comentários em “Enriquecendo e variando o “Abaixe os Ombros!”.”

  1. Poxa Silvia!!! Que bom a Patrícia ter comentado a dúvida dela e você ter tido a atenção que teve ao responder.
    Sempre que percebo um aluno acionando todos os musculos possíveis em um determinado movimento (normalmente os maiores) percebo que é ora de parar tudo, e tentarmos buscar juntos “seu tobogã interno”, a sensação de deslize gostoso da articulação, tento seguir sua orientação e digo: vamos pensar mais em osso e menos em músculo e realmente eles relaxam…é muito gostoso de ver!
    Um aluno me disse: mas parece que assim o músculo nem “trabalha”….rsrs!
    Obrigada pela postagem e parabéns!!

  2. Patricia Lobo

    Olá Silvia, primeiramente agradeço pela atenção e a sua sempre disponibilidade em ajudar o máximo que pode com seus seguidores, posso realmente dizer sou uma destas pessoas, todo dia tou aqui no teu blog.
    Realmente nós mesmos temos que ter calma ao ensinar, e o aluno calma em aprender e ir se conhecendo cada vez mais.
    Gostei muito das suas dicas e exemplos, vai me ajudar muito a entender melhor a cintura escapular que tanto me da dor de cabeça hihihi.
    Gosto muito tb, que agora vc tem colocado sempre o nome do exercicio e qual cadeia cinemátic apertence, obrigada ajuda muito.
    E a ligação a outros postagens que fez sobre o assunto que ajuda a perceber melhor e relembrar.

    Beijo grande e mais uma vez obrigada pela ajuda

  3. Oi Patrícia, sempre me alegra e motiva o fato de contribuir com as aulas de vocês. E fico super feliz quando os comentários aparecem e acabam sendo estímulo para novas postagens. Beijos e boa semana!

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